Prof. Dr. Renato Sabbatini A
imprensa mundial nesta semana deu grande destaque a pesquisas que demonstram
que a maior parte dos produtos de beleza, como cremes e loções
para a pele e os cabelos, contêm alegações infundadas
sobre seus efeitos benéficos. Em outras palavras: apesar de misturarem
vitaminas, algas, extratos de embrião, ácidos, etc. aos constituintes
básicos dos seus produtos, não existem evidências científicas
de que realmente funcionem. Os produtos são caríssimos, aliás,
e voltados essencialmente ao público feminino, que costuma não
medir sacrifícios para os comprar avidamente. Existem potinhos importados,
com uma quantidade ridícula de creme, que custam mais de 100 dólares.
O
que contém um creme hidratante para a pele? Com pouquíssimas
variações contêm um ingrediente básico, a lanolina,
que foi introduzido no mercado de massa de produtos cosméticos na
década dos 30s. A lanolina tem esse nome pois foi extraida quimicamente
pela primeira vez dos pelos da lã de carneiro, conferindo aos mesmos
a maciez característica. É uma mistura de ácidos graxos
(gorduras) e seus ésteres, sintetizada pelas glândulas foliculares
da pele, e que tem propriedades hidrofílicas, ou seja, liga-se com
a água, o que lhe confere o poder hidratante, além do amaciante.
A lanolina é obtida como um subproduto da limpeza da lã bruta,
através da limpeza com sabão, sendo em seguida refinada,
desodorizada, descorada e secada.
Como
produto de beleza, a lanolina no início era um produto caro, exclusivo,
adorado pelas mulheres pelas propriedades que realmente tem de tornar a
pele menos áspera e com melhor aparência. Ela é rapidamente
absorvida pela pele, por isso é usada para transportar substâncias
que se deseja que sejam absorvidas também. Por isso, é o
excipiente mais usado em pomadas de uso farmacêutico. Aliás,
a lanolina não é usada só para isso. É a base
de muitos outros produtos para couros e peles, sabonetes e amaciantes de
roupas e tecidos, sendo algumas vezes misturada com parafina.
Os precursores dos cremes de pele baseado em lanolina mais conhecidos e mais usados no Brasil são os conhecidos Pond´s e Nívea. O problema é que, movidas pela necessidade de ganhar mais dinheiro por unidade vendida, e criar novidades que instigassem sempre a consumidora feminina a continuar comprando, os fabricantes começaram a colocar muitos outros componentes, como vitaminas, em doses minúsculas, e em formas inativas, na maior parte das vezes. Se a leitora soubesse quantos cremes de alto preço possuem substâncias desse tipo, em concentrações de 0,1 a 0,5%, muito abaixo da sua dose efetiva, certamente não iria gastar seu suado dinheirinho neles. A moda agora é colocar vitaminas C e E, que pertencem ao grupo das hidrossolúveis e antioxidantes, mas cujo efeitos por absorção cutânea não estão documentados cientificamente de forma irrefutável. As fórmulas de alguns cremes são positivamente bizarras, para não dizer esotéricas. O Creme de la Mer, que foi criado pelo cientista da NASA Max Huber, que sofria de queimaduras químicas atrozes, é um exemplo. Recentemente, a prestigiosa empresa americana Estée Lauder comprou a fórmula, depois que Huber morreu. O creme é baseado em uma mistura secreta de vitaminas, minerais e certas algas marítimas colhidas de acordo com o ciclo lunar. A preparação envolve fermentação durante meses, ao som de borbulhas gravadas em fermentações anteriores, e com pulsos periódicos de luz, para “ energizar” o creme (não estou brincando...). Além disso, à receita original foram adicionados malaquita (que de acordo com uma “ cientista” da La Mer, “ atrai a energia do sol” (seja lá o que isso significa...), pedaços de prata e de ouro, para “dar propriedades antibacterianas, e pelo fato dos metais absorverem a luz e transferi-la para o creme, para torna-lo ainda mais potente.” Seria ridículo, se o creme não custasse 150 dólares para um pote de 57 miligramas, e não fosse comprado por mulheres do mundo todo, que nesse momento conseguem perder toda a racionalidade em troca de um efeito duvidoso. A lanolina continua sendo parte do creme, e é muito provavelmente ela que confere o efeito, igualzinho ao humilde e baratinho creme Nívea, mas que a credulidade dos compradores pensa ser diferente... Mais
problemático ainda é o fato de que muitos dermatologistas
e cosmetólogos recomendam e revendem esse creme em seus consultórios,
a preços remarcados muito acima da tabela. Uma excelente fonte de
renda para todos, sem dúvida. Mas, assim como os florais de Bach
e outras enganações da medicina alternativa, deveriam ser
examinados mais cuidadosamente pela Agência de Vigilância Sanitária,
que os aprovam sem maiores contestações à sua validade
científica.
Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 18/8/2000. Autor: Email:WWW: http://www.sabbatini.com/renato/ Jornal: http://www.cosmo.com.br
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